Todos os anos, a COP expõe o choque entre a ciência do clima e as disputas de poder global. E em Belém, a COP30 parece prestes a repetir esse enredo. As negociações entre países, apesar de focarem na ação climática global, são incessantemente travadas por profundas e históricas divisões entre o Norte e o Sul Global. Entender esses obstáculos geopolíticos é fundamental para decifrar os resultados – muitas vezes ambíguos – das COPs.

Crises geopolíticas em curso não apenas influenciam, mas frequentemente determinam o ritmo e a ambição dos acordos climáticos. Um exemplo é a guerra na Ucrânia. A invasão russa, além da catástrofe humanitária, gerou uma crise energética na Europa, historicamente dependente do gás russo. A resposta imediata foi um retorno ao uso de combustíveis fósseis mais sujos, como o carvão mineral. Apesar de ser uma solução de curto prazo, a decisão representa um retrocesso em relação aos compromissos de transição energética estabelecidos em acordos anteriores, como o Pacto de Glasgow (COP26).

Crises geopolíticas em curso não apenas influenciam, mas frequentemente determinam o ritmo e a ambição dos acordos climáticos

A crise global pressiona economias, levando nações a priorizarem o crescimento econômico e a segurança energética imediata em detrimento das metas de longo prazo. A tensão é particularmente aguda para os países do hemisfério sul, que afirmam precisar de assistência financeira robusta para realizar uma transição justa. Um dos maiores entraves nas negociações é a falta de consenso sobre adaptação e mitigação. Países em desenvolvimento cobram que a primeira tenham o mesmo peso que a segunda, mas as nações ricas resistem em assumir plenamente esse compromisso.

A promessa dos países ricos de mobilizar US$ 100 bilhões anuais para ajudar as nações em desenvolvimento a mitigar e se adaptar às mudanças climáticas, feita em Copenhague (COP15) em 2009, nunca foi totalmente cumprida no prazo estabelecido para 2020. Essa falha gera uma profunda desconfiança, assim como a negociação sobre o Fundo de perdas e danos. Após anos de impasse, a criação deste fundo na COP27 (realizada no Egito) foi uma vitória histórica para as nações em desenvolvimento. Os debates sobre quem deve contribuir – com o Norte Global pressionando para incluir economias emergentes como a China – e sobre como os recursos serão distribuídos, seguem como fonte de tensão.

Para as economias em desenvolvimento, essa falta de compromisso financeiro é uma prova de que os países mais ricos não estão dispostos a assumir sua responsabilidade histórica pelas emissões acumuladas desde a revolução industrial. Essa percepção é agravada pelo fato de que os financiamentos prometidos são frequentemente canalizado como empréstimos, e não como doações, o que aumenta o endividamento dos países mais pobres e vulneráveis.

Enquanto pressionam nações em desenvolvimento a adotar metas rigorosas e a acelerar a transição energética, países europeus reativam usinas a carvão, ignorando os impactos ambientais e seus próprios compromissos climáticos. Essa contradição revela um padrão de injustiça climática: quando os interesses nacionais dos ricos estão em jogo, as promessas de descarbonização são flexibilizadas, impondo ao Sul um peso desproporcional e corroendo a confiança necessária para uma cooperação internacional justa.

A Amazônia, maior floresta tropical do planeta, é central na geopolítica do clima. Além de ser um “pulmão do mundo”, a região também é um território de disputa por recursos estratégicos. A transição global para energias limpas, marcada pelo avanço de veículos elétricos, painéis solares e baterias, impulsionou a corrida por “minerais verdes” como lítio, níquel, cobalto e cobre – recursos encontrados em reservas na bacia amazônica.

Assim foi criado um paradoxo geopolítico, pois a mesma agenda que busca proteger o clima, coloca a Amazônia sob nova pressão de exploração. A disputa envolve potências globais como China, que lidera o refino de terras raras, e países ocidentais como os EUA e da União Europeia, que buscam diversificar suas cadeias de suprimento.

A COP30 em Belém refletirá diretamente essas tensões. Realizada no coração da Amazônia, a conferência é uma oportunidade para o Brasil atuar como ponte de diálogo e colocar a realidade da região no centro dos debates. No entanto, o Brasil também enfrenta contradições internas, como o debate sobre a exploração de petróleo na foz do rio Amazonas, que pode minar a credibilidade do país como líder ambiental.