No dia 9 de junho de 2025, um barco chamado Madleen foi interceptado em águas internacionais rumo à Faixa de Gaza. A bordo, defensores e defensoras de direitos humanos e do clima desafiaram, com coragem, o bloqueio imposto por Israel, levando alimentos e remédios para uma população que está literalmente morrendo de fome. Entre eles estavam Greta Thunberg, símbolo global da juventude climática, e o brasileiro Thiago Ávila, ativista de direitos humanos e das causas do clima. No barco da Flotilha da Liberdade estavam outros dez representantes de diferentes países, incluindo o ator Liam Cunningham, de Game of Thrones e a eurodeputada Rima Hassan.
Desde então, os acontecimentos se acumulam em gravidade e urgência, contrastando com a apatia de grande parte da cobertura midiática. Os ativistas foram interceptados e retirados do barco por militares de Israel em águas internacionais, a 200 km da costa. Greta foi liberada após detenção. O governo brasileiro, por meio do Itamaraty, solicitou explicações formais a Israel sobre a detenção do ativista brasileiro, que acabou sendo deportado, devendo chegar ao país amanhã, 13 de junho.

O barco Madleen, interceptado em águas internacionais, nos serve de alerta: não há justiça climática sem justiça internacional
O que os ativistas tentaram fazer, entrando em Gaza, não foi apenas um gesto humanitário. Foi também um ato político profundo, que expõe as fragilidades e a urgência do sistema internacional de deliberação multilateral. O mesmo sistema que organiza os acordos climáticos, como o Acordo de Paris e a Conferência das Partes da ONU (COP), é o que está falhando em garantir um cessar-fogo em Gaza.
A guerra em Gaza – ou melhor, o massacre do povo palestino – já foi alvo de diversas resoluções da Assembleia Geral da ONU. Em junho de 2025, uma resolução no Conselho de Segurança pelo cessar-fogo imediato e incondicional foi aprovada por 14 países, mas vetada pelos Estados Unidos, o único voto contrário.
Essa é a mesma ONU, com a mesma estrutura institucional, que se reúne anualmente para negociar os termos do combate à crise climática. Se não somos capazes, enquanto comunidade internacional, de cessar uma guerra localizada que, segundo a Unicef, já matou ou feriu mais de 50 mil crianças, como esperamos alcançar consensos eficazes para enfrentar o colapso climático global?
A efetividade da COP30 está em jogo. O evento precisa ir além dos discursos e promessas: deve representar o renascimento da confiança nos acordos internacionais. E essa confiança depende diretamente da capacidade do sistema multilateral de proteger vidas e assegurar justiça – climática e humanitária.
O barco Madleen, com Greta, Thiago e outros ativistas interceptados em águas internacionais, nos serve de alerta. A ação nos diz que não há justiça climática possível sem justiça internacional. Intervir para parar o massacre de Gaza hoje é também salvar a possibilidade de acordos futuros. Romper o bloqueio à ajuda humanitária é também romper com a apatia que ameaça paralisar o mundo diante das múltiplas crises.
Não há fronteira possível entre o direito de existir de uma criança palestina e o de uma criança ribeirinha que verá sua comunidade desaparecer diante da crise climática. Tudo está interligado. O sistema que permite a continuidade de guerras e genocídios é o mesmo que permite a continuidade da exploração predatória dos recursos naturais, da destruição das florestas, do racismo ambiental e das desigualdades, incluindo a climática.
Greta e Thiago não estavam apenas tentando levar suprimentos. Eles estão expondo suas vidas para salvar a dignidade dos tratados internacionais. Estão nos lembrando que a política exige coragem, e que a juventude, como sempre, está na linha de frente da construção de outro futuro.
Salvar Gaza é reafirmar que o mundo ainda pode, sim, tomar decisões coletivas em nome da vida. O barco Madleen foi muito mais do que um gesto humanitário. É um manifesto global por paz e justiça climática.