“Com as mudanças climáticas, a floresta fica mais sensível”, afirmou Ane Alencar, diretora de Ciência do IPAM, durante uma roda de conversa sobre incêndios florestais realizada na última terça-feira (18), no Instituto de Ciências da Arte da UFPA, o ICA, no Centro de Belém, que tem servido de sede para uma série de debates organizados pela Central da COP.
Ane e outros especialistas explicaram que nem todo fogo é ruim; o problema é quando ele sai do controle e onde ocorre. A Amazônia, por exemplo, é uma floresta úmida em que o fogo não faz parte da dinâmica natural. No entanto, áreas desmatadas são frequentemente incendiadas para “limpar” o terreno. Com o aumento da degradação florestal, influenciada também pelas mudanças climáticas, o fogo se espalha com mais facilidade para regiões ainda com árvores em pé.
O prolongamento da seca tem deixado a Amazônia mais exposta a queimadas - Foto: Bruno Kelly/Amazonia Real.
A geógrafa Marcia Macedo, pesquisadora associada ao IPAM, explicou que, assim como os seres humanos precisam beber mais água quando o tempo está mais quente e seco, as árvores também sentem mais sede. Isso significa que, com o prolongamento da estação seca na Amazônia, elas ficam ainda mais sensíveis ao fogo provocado por ação humana. “Uma floresta que não queimava quando comecei a trabalhar em 2005 [no Alto do Xingu] agora queima na estação seca”, comentou. Pesquisas já concluíram que as mudanças climáticas tornaram a estação seca na Amazônia mais longa e intensa.
Ao perder árvores, a floresta reduz sua capacidade de reter gás carbônico. Com o fogo, ela também libera esse gás, já que as árvores armazenam carbono em sua biomassa. Isso significa que a perda de vegetação agrava as mudanças climáticas, que, por sua vez, tornam a floresta ainda mais sensível. É um ciclo de retroalimentação.
Diferentemente da Amazônia, o Pantanal e o Cerrado têm o fogo como elemento de suas dinâmicas. “Existem sementes que só germinam com fogo”, comentou Christian Berlinck, diretor de Políticas de Manejo Integrado do Fogo no Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima. “O fogo pode existir, desde que seja pouco, natural ou manejado”, completou. O problema é que esses biomas também têm sido vítimas de incêndios criminosos, que se intensificam com o calor e a seca agravados pelas mudanças climáticas.
Situação do Brasil
Em 2024, o ano mais quente da história desde o início das medições, mais de 30,8 milhões de hectares foram queimados no país — um aumento de 79% em relação a 2023, segundo dados do MapBiomas. Cerca de 73% das áreas queimadas eram de vegetação nativa, principalmente formações florestais. A Amazônia foi o bioma mais afetado.
Dados compilados pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) até 18 de novembro indicam que, em 2025, as queimadas diminuíram 53% em comparação ao mesmo período de 2024. O Cerrado lidera os registros, com 45% do total, seguido pela Amazônia, com 29%.
Monitoramento do Copernicus, observatório climático da União Europeia, mostrou que o primeiro semestre de 2025 foi marcado por intensos incêndios florestais em várias partes do planeta.
No Canadá, entre abril e maio, registrou-se uma temporada severa de incêndios alimentados por secas moderadas, altas temperaturas e ventos fortes. No início de junho, as emissões totais estimadas de carbono provenientes dos incêndios atingiram 56 megatoneladas. Segundo o Copernicus, este foi o segundo maior volume já registrado, atrás apenas dos incêndios históricos de 2023. No país, muitos incêndios são iniciados por raios.

Na Rússia, parte do Extremo Oriente entrou em estado de emergência por causa do fogo, com alguns focos ocorrendo dentro do Círculo Polar Ártico. Alemanha e Reino Unido — regiões historicamente pouco propensas a incêndios florestais — registraram queimadas recordes. Parte da Europa enfrentou uma primavera excepcionalmente seca e quente.
A Coreia do Sul registrou, em março, os incêndios florestais mais mortais e intensos de sua história. Em apenas uma semana, mais de 100 mil hectares foram queimados, 5 mil edifícios foram destruídos e ao menos 32 pessoas morreram.
O segundo semestre também foi marcado por grandes incêndios. Grécia, Turquia e Chipre enfrentaram queimadas intensas no fim de junho e início de julho. Regiões da França, Portugal e Espanha foram duramente afetadas em agosto.